28 março 25 Toda a OA
Breves notas sobre os arquitetos perante o Estado da Nação
Ponto de situação ou, dito de outro modo, ponto de procrastinação
No próximo mês de maio vamos novamente a eleições legislativas. E, mais uma vez, importa garantir que os partidos políticos possam incorporar nos seus programas algumas das principais preocupações dos arquitetos portugueses.
Permitam-nos destacar três temas ligados diretamente aos arquitetos onde é necessário promover grandes consensos nacionais e defender o interesse público. Desde logo na habitação, onde continuam a crescer as carências e a demora na execução dos programas de habitação pública. A execução do PRR e a ligação do setor imobiliário à construção e à reabilitação de edificado existente e expectante de alojamento acessível é fundamental. Em nosso entender, temos de passar das palavras à ação; por um lado, não perder nenhum euro dos fundos disponibilizados, e, por outro, com transparência, continuar o investimento público e as políticas públicas iniciadas e desenvolvidas nas legislaturas anteriores.
No que toca às grandes infraestruturas, nomeadamente no que diz respeito aos processos que estão agora numa fase crucial (aeroporto, alta velocidade, etc.), também teremos de passar da programação à construção. E isso implica envolver as classes profissionais no cerne destes dossiês e nas soluções que são necessárias criar para evitar constrangimentos técnicos e a realização de más opções políticas. Se possível, e sem prejuízo da livre circulação de mercado, promovendo a valorização nacional, evitando que se crie a expetativa que estão nos grupos internacionais as soluções técnicas, os meios e os prazos para resolver milagrosamente a realização destas grandes operações nacionais.
Finalmente, na gestão territorial. E, neste âmbito, sublinha-se o difícil tema dos procedimentos administrativos. Atualmente, a Ordem dos Arquitectos tem em curso vários dossiês em interação com o Governo. Todos possuem relevância para a prática profissional, mas alguns deles já levam mais de dois anos de desenvolvimento e tardam as resoluções - se no início do ano estávamos otimistas pois o ano de 2025 apresentava-se como um ano de concretizações efetivas, infelizmente fomos ultrapassados pela realidade, e o momento político veio criar indefinição em dossiês fundamentais que estamos sempre a reclamar do atraso. Destacamos a legislação com incidência nas matérias diretamente relacionadas com o Licenciamento Urbanístico, o denominado Simplex está (ou estava) numa fase de revisão final, mas com este impasse político voltou a tardar. E se era já premente corrigir a situação atual, transversal a todos os municípios, onde existe uma demora significativa de âmbito procedimental, agora, com a situação política a procrastinar a definição de novos diplomas, o assunto tornou-se dramaticamente urgente.
No entanto, para além do tema “simplex”, continua a tardar a revisão do RGEU que outrora se decidiu chamar de Código da Construção. Também esse dossiê tem tido, mais uma vez, fortes atrasos – e não vislumbramos a sua rápida conclusão. Tarda também a chamada PEPU, dita Plataforma Eletrónica dos Procedimentos Urbanísticos, uma ferramenta eletrónica que seja igual para todos os municípios, impedindo a arbitrariedade que continua a existir e até arriscávamos dizer que está a crescer. Finalmente, tarda ainda a regulação dos seguros profissionais, uma simples portaria que se mostra essencial num contexto em que a mudança de modelos de contratação coloca os projetistas, a cada dia que passa, com cada vez maior (ir)responsabilidade.
Sobre o investimento na valorização da prática profissional e a preparação do processo normativo
Para a Ordem dos Arquitectos o assunto da maior importância continua a ser a desvalorização da prática dos serviços de arquitetura. A Ordem dos Arquitectos apostou afincadamente no tema e recentemente apresentou publicamente o “relatório dos honorários na encomenda pública em Portugal”.
Felizmente o documento teve impacto, nomeadamente institucional. Assim, munidos desse documento obtivemos audições nas principais instituições que podem atuar sobre esta matéria. E neste momento, podemos afirmar que tivemos audiências fundamentais, das quais destacamos os encontros oficiais com a Senhora Presidente do Tribunal de Contas e a respetiva Secretaria-Geral, com a Presidência da Autoridade da Concorrência e respetiva Direção de Serviços, e com o Ministério das Infraestruturas e Habitação, e respetiva equipa ministerial. Em todos estes encontros obtivemos o amplo reconhecimento da gravidade da atual situação. Nestes encontros também emergiram matérias de relevo nacional, em especial com algumas possibilidades de como como atuar na melhoria da prática profissional.
Obtivemos a disponibilidade para poder trabalhar, mesmo sabendo que estamos balizados por um quadro de legislação muito omissa, adversa à regulação baseada na qualidade e na defesa do interesse público, mas sobressaiu a possibilidade de introduzir melhorias significativas.
Obviamente, resulta deste processo que a Ordem dos Arquitectos terá de realizar uma proposta de Quadro Regulatório da Profissão, procurando, no âmbito das suas atribuições, inverter o recente processo de desvalorização da prática profissional, o que implica um esforço enorme de produção de documentos que visem a articulação dos principais agentes no ecossistema dos serviços de arquitetura, e tempo. Em suma, numa primeira avaliação podemos estar satisfeitos com os resultados que o relatório sobre honorários obteve, pois inclui o tema na agenda destas instituições e preparou o caminho para o processo normativo que necessariamente terá de existir.
Julgamos que existem sinais de melhorias, desde logo uma ténue, mas gradual mudança de atitude na encomenda de serviços de arquitetura, quer dos serviços no setor público como no setor privado, mas temos de estar conscientes que não será um processo fácil e, pior do que isso, não será um processo tão rápido como desejamos.
Por outro lado, parece que a empregabilidade dos arquitetos se encontra em níveis relativamente elevados e o forte volume de emigração de outrora está em diminuição. No entanto, não nos podemos distrair, continuamos a ser uma das profissões mais desvalorizadas e são necessárias medidas para que a arquitetura e os arquitetos consigam cumprir o seu principal desígnio – desenhar com qualidade as nossas cidades e contribuir para o interesse público.
A necessária representatividade política dos arquitetos
Uma última palavra de mobilização para os arquitetos. Sabemos que hoje o exercício de cargos de política ativa não são atrativos, e, nalguns casos, são vistos até como situações a evitar. E sabemos também que, quando em comparação com outras atividades profissionais, possuímos muito menos representatividade seja em órgãos autárquicos, seja em órgãos parlamentares ou de Estado. Por isso é importante que a classe profissional a que pertencemos assuma que devemos impulsionar o envolvimento na construção dos processos de decisão da sociedade. Para quem está na Ordem dos Arquitectos é bastante claro que quando nos deparamos com interlocutores arquitetos nos principais cargos de decisão (deputados, vereadores, presidentes de municípios, governantes, etc.), o diálogo se torna mais fácil, e a importância da nossa ação é muito mais fácil de demonstrar e todos ficamos um pouco a ganhar com estes factos. E isso acontece não por uma motivação de matriz corporativa mas simplesmente porque a linguagem e a compreensão das problemáticas inerente à arquitetura estão facilmente presentes. Estamos convictos que o País precisa de mais arquitetos no exercício de funções de relevo. Por esse motivo, sugerimos aos arquitetos que, neste ano de 2025, pontuado por várias eleições, procurem a energia e a motivação pessoal e se envolvam nos processos democráticos.
Avelino Oliveira
Presidente da Ordem dos Arquitectos