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21 abril 24 Secção Regional LVT

Conferência "Políticas do Habitar numa Perspetiva Decrescentista"

Da esquerda para a direita: Hans Eickhoff, Jorge Farelo Pinto, Filipa Cabrita, Joana Trindade e Álvaro Fonseca

A outra vida dentro da vida

A ação e energia transformadoras das iniciativas coletivas, a criação de espaços de reflexão e de ação, a necessidade de colaborar comunitariamente e a crítica à produção e consumo sem limites foram alguns dos tópicos centrais assinalados pelos participantes na conferência “Políticas do Habitar numa Perspetiva Decrescentista” (19 de abril, na sede da Ordem dos Arquitectos).

Integrada no Ciclo Encontros, uma organização da OASRLVT, a conferência serviu para fazer um ponto de situação da atividade de dois coletivos que defendem a responsabilidade social e ambiental, iniciativas sociais de economia solidária e a crítica ao crescimento económico e extrativista – a Rede para o Decrescimento, RPD, e a secção de habitação e construção da Cooperativa Integral Minga, CIM.

A RPD, criada em 2018 e apresentada pelo médico Hans Eickhoff, pelo biólogo Álvaro Fonseca e pelo arquiteto Jorge Farelo Pinto (que conduziu a conversa) baseia as suas atividades na necessidade urgente de uma reorganização da vida social e produtiva que assegure o equilíbrio ambiental, a biodiversidade e a recuperação dos ecossistemas.

“Simplicidade, convivialidade, valorização dos bens relacionais, liberdade e equidade, vida dentro dos limites planetários”, eis o que defendemos, disse Hans Eickhoff.

“Somos um coletivo informal, aberto, horizontal e apartidário”, disse Álvaro Fonseca, que explicou a escolha do caracol como símbolo da RPD: “Não se trata apenas do exercício da lentidão, trata-se do que acontece com a concha calcária destes animais, cujo crescimento em espiral nunca é superior ao peso que o caracol aguenta”.

A RPD está ancorada no debate feito pelo movimento internacional de há décadas, como é possível descobrir no livro que reúne 50 pensadores e ensaístas que exaltam a vida cívica, a coletividade ou a preocupação com a natureza, “Aux Origines de la Décroissance” [Nas Origens do Decrescimento”].

Jorge Farelo Pinto defendeu a releitura dos valores e fundamentos do habitar, através da análise das políticas de habitação (falou da Unidade de Execução do projeto urbanístico para Marvila, conduzido por privados e subscrito pela Câmara de Lisboa, “como exemplo da habitação como mercadoria simples, com a construção mais barata possível”), da necessidade de análise crítica da gestão territorial, das perspetivas decrescentistas (em que o modelo cooperativo de habitação assume protagonismo renovado) e das chamadas “leituras da realidade” (a observação a cada passo dos dados disponíveis, como a existência de 5,9 milhões fogos em Portugal para 4,1 milhões agregados, 17,1% de casas sobrelotadas (2021) ou da percentagem de habitação cooperativa – 2,9% em Portugal, quando a média europeia é de 12%, e na Holanda é de 30% ou na Áustria 24%.

As arquitetas Filipa Cabrita e Joana Trindade explicaram o propósito da CIM, cooperativa sedeada em Montemor-o-Novo, em que “integral” significa que esta associação atua em diferentes áreas simultaneamente (agricultura, comercialização, serviços e habitação e construção).

Numa altura em que a CIM desenvolve um projeto cooperativo de habitação (através do CHEE, projeto de Cooperativa de Habitação Económica e Ecológica), as arquitetas explicaram que a secção de habitação da CIM se pauta pela preocupação, nos fundamentos habitacionais, em lutar pela convivialidade, intergeracionalidade e multiculturalidade e combater o isolamento.

Numa zona do Alentejo fortemente afetada pela emigração forçada, as arquitetas construíram um serviço de apoio técnico às famílias e aos cidadãos e desenvolvem soluções com fins específicos – são preocupações reduzir custos, tomar em mãos as soluções da ideia à materialização e ajudar a encontrar soluções de autogestão das comunidades.

O respeito e atenção aos materiais vernaculares da região (matéria-prima local e transformação local) e às técnicas construtivas que melhor se adaptam ao clima e que são ecologicamente sustentáveis, com minimização dos recursos energéticos e hídricos, tratamento dos resíduos e a atenção à reabilitação do património, trazem a CIM para um entendimento contemporâneo da habitação cooperativa.

Esse entendimento, com foco na vida comunitária, quer, nomeadamente, responder ao mercado especulativo através da referência local de preços mais baixos, do regime de propriedade coletiva, e do modelo de habitação colaborativa (desenvolvimento conjunto de projeto, construção, gestão, espaços partilhados, interação social), pondo em causa a “exagerada importância da propriedade privada”.

Quer a RPD quer a CIM põem a tónica nas ações conjuntas e continuadas, nas aprendizagens coletivas e no reforço mútuo e cooperativo da troca de experiência acumulada com outros coletivos.

No arranque da sessão, o arquiteto Marco Lopes da Silva, membro da direção da OASRLVT, relembrou o desafio para esta sessão: “A importância de estarmos nesta iniciativa tem a ver com a criação de espaços de reflexão e discussão, quando a habitação está na ordem do dia pelas piores razões”; relembrou, também, a presença da Casa noutra iniciativa, o Congresso Internacional da Habitação no Espaço Lusófono – 5CIHEL2024, que vai decorrer entre 2 e 4 de outubro, com a parceria do LNEC, Câmara de Lisboa e Ordem dos Engenheiros.

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