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Início > Prémio Fernando Távora

Fernando Távora, Bom Jesus de Valverde, Évora, passeio com alunos da FAUP, 1 de julho de 1993. ©Fundação Marques da Silva, Arquivo Fernando Távora

Prémio Fernando Távora

O Prémio Fernando Távora visa a atribuição uma bolsa de viagem no valor de 6000 euros à melhor proposta de viagem de investigação apresentada por um(a) arquiteto(a) inscrito(a) na Ordem dos Arquitectos.
Organizado anualmente pela Secção Regional do Norte da Ordem dos Arquitectos (OASRN) desde 2005, o Prémio conta com parceria da Câmara Municipal de Matosinhos, Casa da Arquitetura e Fundação Marques da Silva, e patrocínio da Ageas Seguros.

Em homenagem ao arquiteto Fernando Távora, em memória da sua figura que influenciou gerações sucessivas de arquitetos, pela sua atividade enquanto arquiteto e pedagogo, a SRN decidiu promover um prémio anual, de uma bolsa de viagem destinado a todos os arquitetos inscritos na OA, para a melhor proposta de viagem de investigação, a selecionar por um júri nomeado todos os anos para o efeito.

Desde estudante e durante toda a sua vida, Fernando Távora viajou incessantemente para estudar in loco a arquitetura de todas as épocas em todos os continentes, utilizando-a desde 1958 até 2000, como conteúdo e método da sua atividade pedagógica. As suas aulas e a sua prática projetual consolidaram, em sucessivas gerações, em Portugal e no estrangeiro, a ideia de que o conhecimento da história e da cultura são indispensáveis para a produção da arquitectura contemporânea.

Simultaneamente, é a própria prática da arquitetura que hoje se desenrola cada vez mais no palco mundial, transcendendo largamente os contextos locais. Arquitetos de todo o mundo contribuem com propostas para outros países, outras culturas, e nesta realidade global, de intensas trocas de experiências é importante preparar os arquitetos através de experiências reais de confronto in loco.

Cumprir-se-á assim uma das heranças do arquiteto portuense: a extraordinária capacidade de investigar sobre o sentido das coisas, as suas raízes, a grande curiosidade pelo outro, ancorada numa forte ligação ao seu contexto de origem, na defesa da dignidade do homem, e respeitador das suas diferenças.

O Prémio Fernando Távora destina-se a perpetuar a memória do arquitecto, valorizando a importante contribuição da viagem e do contacto directo com outras realidades, na formação da cultura do arquiteto.

Biografia do Arquiteto Fernando Távora

Fernando Luís Cardoso Menezes de Tavares e Távora nasceu a 25 de Agosto de 1923, filho de José Ferrão de Tavares e Távora e de Maria José Lobo de Sousa Machado Cardoso Menezes.

Em 1945 iniciou os estudos de Arquitetura na Escola Superior de Belas Artes do Porto, que concluiu em 1950 com o projeto de uma casa sobre o mar, onde afirmou desde logo a sua posição como arquiteto moderno. Entre 1951 e 1959 virá a ser dos poucos representantes portugueses nos "Congressos Internacionais da Arquitecura Moderna", onde conhecerá não só Le Corbusier como os melhores arquitetos modernos da época.

Em 1947, publicara a versão final do ensaio "O problema da casa portuguesa; Falsa arquitectura; Para uma arquitectura de hoje", onde sintetizara a noção de uma arquitetura simultaneamente moderna e enraizada na cultura em que se insere, aspiração que, na época, mobilizava alguns dos Arquitetos mais ativos culturalmente em Portugal. Neste ensaio apresentava, também, a necessidade de se estudar cientificamente a arquitetura popular portuguesa. Nada mais natural, portanto, do que vir a integrar em 1955, a equipa do "Inquérito à arquitectura popular portuguesa", a iniciativa mais ambiciosa, até hoje, relacionada com o tema, e que seria extremamente influente no futuro da arquitetura em Portugal.

Desde estudante e durante toda a sua vida, viajou incessantemente para estudar in loco a arquitetura de todas as épocas em todos os continentes, utilizando-a desde 1958 até 2000, como conteúdo e método da sua actividade pedagógica. As suas aulas e a publicação da sua prova para professor agregado ("Da organização do espaço", 1962) consolidaram, em sucessivas gerações na Escola Superior de Belas Artes do Porto, na Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto e no Departamento de Arquitectura da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, a ideia de que o conhecimento da história e da cultura são indispensáveis para a produção da arquitectura contemporânea.

As suas obras construídas, como o Mercado Municipal de Santa Maria da Feira (1953-59), o Parque Municipal Quintas da Conceição e de Santiago, Matosinhos (1956-93), a Casa de Férias no Pinhal de Ofir, Fão (1957-58), a Ampliação do Edifício do Parlamento, Palácio de S. Bento, Lisboa (1994-99) ou a Casa dos 24, Porto (1995-2003), exprimem um grande sentido de responsabilidade social, na maneira como criatividade e poética estão presentes a par do rigor na abordagem ao sítio, à função e aos aspetos técnicos. Nesta medida, a sua obra constitui um exemplo importantíssimo para a credibilização da atividade do arquiteto em Portugal. Também no campo da conservação do património deixou intervenções exemplares, como a Recuperação do Convento de Santa Marinha, Guimarães (72-85), a Sistematização do Centro Histórico de Guimarães (85-92), ou o Restauro do Palácio do Freixo, Porto (96-03).

A sua importância para a arquitetura em Portugal foi reconhecida com a atribuição do doutoramento Honoris Causa pela Universidade de Coimbra em 1993, com diversos prémios, entre os quais o Prémio Nacional de Arquitectura em 1987, pela publicação regular nas publicações especializadas nacionais e internacionais e pela publicação da sua obra completa.

Texto "Diário da Viagem aos USA, 1960"

Dia grande! Uma bela manhã de Primavera. Às 9 e pouco estava a perguntar ao homem do Hotel o caminho para Taliesin. "Talvez tomando um bus para Spring Green…", o melhor é perguntar ali em frente. Lá fui aos bus. Sim senhor, às 10,45 e está às 11,54 em Spring Green. A viagem correu normalmente. A paisagem bonita, com grandes campos e colinas suaves.

Spring Green é uma pequena aldeia rural.
Quando saí do bus sabia apenas que estava em Spring Green, nada mais. Achei por bem dirigir-me ao edifício dos Correios, ali perto da paragem do bus. Perguntei à Senhora: “Pode dizer-me como posso ir a Taliesin?” “Tem de voltar para trás e atravessar a ponte nova, mas agora não está lá ninguém; eles ainda não voltaram”. (A Senhora julgava que eu tinha carro e além disso que os queria ver). “Mas eu não tenho carro, não é possível alugar um táxi, ou ir a pé?”; “A pé? São umas 6 ou 7 milhas e táxis… não me parece possível…” Entrou então na conversa um homem de idade que depois soube ser o marido da Senhora (o Correio estava mesmo para fechar); o homem coçou o queixo e insistiu. “A Taliesin, mas o Sr. não vê nada e aqui não há táxis…; talvez numa garagem arranje alguém que o leve…”. “Não tenho pressa, disse, queria almoçar primeiro e seguir depois; volto para Madison às 7 e tal, portanto tenho muito tempo”. “Almoçar? Só se comer uma sandwich, ali (e apontou-me uma casa) porque aqui não há restaurantes… mas o mais difícil é ir a Taliesin…”; “…nem que eu tenha de ir a pé, vim de Portugal para ver Taliesin…”. O argumento foi decisivo. O homem disse-me então: “Há-de-se arranjar transporte…”. Neste momento parou um carro em frente ao Correio e o velhote deu-me um pequeno empurrão e disse: “Peça àquele senhor, talvez ele possa lá ir…”. Cheio de coragem (a necessidade faz milagres) avancei e perguntei: “Please Sir, are you going to Taliesin?” “I? Not now” e avançou sem me ligar importância. O velho então entrou em acção e contou-lhe a minha desdita; “Mas eles não estão lá, está tudo fechado” – “Mas eu tenho de ir…” – “Vá então almoçar e à meia hora eu vou buscá-lo ali”. Dei um suspiro de alívio; se o correio fechava sem eu resolver o meu problema não sei o que seria de mim.
Para “variar” comi “hamburguer” e bebi um copo de cerveja e à hora combinada estava cá fora. O homem apareceu pontualmente.
Entramos no carro e eu contei-lhe com mais pormenor a minha história; "mostro-lhe tudo, conheço muito bem Taliesin e conheci Mr. Wright; trabalhei com ele algumas vezes…"

"O caminho agora é mais longo porque construíram uma ponte nova e é preciso ir à "highway".Lá saímos de Spring Green, entramos na dita "highway" num percurso pequeno e metemos à direita; "aquela pedra foi ali posta há tempo por Mr. Wright, naturalmente para gravar alguma coisa, mas nada fizeram depois dele morrer…". "E pode ver-se o sítio onde ele está enterrado?”. “Pode, está junto de uma pequena capela, eu mostro-lhe” – Fomos andando. Em certa altura o homem parou o carro e mostrou-me o sítio da velha ponte sobre o rio; “foi nesta estrada que morreu a filha de Mr. Wright, um desastre de automóvel, há anos; aqui (e centrou-me o lado oposto ao rio) Mr. Wright comprou uma “farm” e começaram a construir um edifício, creio que para um restaurante; ele queria construir sobre a estrada, mas "eles" não deixaram…".

Vi então a estrutura de um edifício que domina todo o rio e cuja construção deve estar suspensa já há tempo. "É possível que a "fellowship" acabe a construção. Eles querem continuar os trabalhos de Mr. Wright…".
Seguindo um pouco e ao fim de uns segundos eu via, cortando o ponto mais alto de uma colina, a casa de Wright; afastada, uma outra colina, mas situado na encosta, o conjunto de edifícios vermelhos (dum vermelho terra), de uma "farm". É um momento que não posso esquecer, o desse primeiro contacto com Taliesin. A paisagem sem ser grandiosa é grande e os edifícios sem serem grandes sentem-se perfeitamente na paisagem, sem, de qualquer modo, a desvalorizarem. A ideia de Taliesin como uma construção desfez-se nesse momento no meu espírito; Taliesin é uma paisagem, Taliesin é um conjunto, em que é porventura difícil distinguir a obra de Deus da obra dos Homens. Devo dizer, além disso, que o sítio é duma beleza surpreendente…
Mas o Senhor não me dava tempo para pensar; vamos ver agora o sítio onde Mr. Wright está enterrado. Seguimos. Passamos pela entrada da casa, cá em baixo e vimos uma grande represa, água doce. "Quando Mr. Wright cá estava aquilo estava sempre cheio de água…" Metemos à esquerda e apareceu-nos então uma pequena capela, muito simples, com um campanário, construída em madeira. Paramos e o homem avançou. “Está aqui”. Disse prosaicamente. Ao lado da capela vi então um pequeno cemitério. Mais próximo da entrada a campa de Wright: pequenas pedras limitavam um rectângulo envolvido por um círculo, construído do mesmo modo; num dos vértices do rectângulo nasce da terra uma pedra, igual a tantas daquelas que ele usou nos seus edifícios, de forma irregular, mas cuja secção aumenta à medida que se levanta; não sei se há qualquer simbolismo naquela pedra, eu permiti-me encontrá-lo. Atrás, uma pequena pedra, protegida por uma árvore, tem gravada esta inscrição: 
MAMAH
BORTHWICK
CHENEY
1869
1914
É o túmulo de MAMAH, a mulher assassinada e queimada em Taliesin que Wright enterrou naquele lugar.
Não longe outra pedra gravada: ANNA LLOYD WRIGHT / BELOVED MOTHER OF / FRANK, JANE AND MAGINEL / SHE LOVED THE TRUTH AND SOUGHT IT.
Ali repousa a mãe de Wright, a cuja família pertencera Taliesin.
Afastada, uma coluna branca, tem inscrito o nome jones, creio que o avô de Wright.
Aqui e ali mais túmulos de pessoas que, pelos nomes, se verifica pertencerem à mesma Família.
O sítio é extraordinariamente tranquilo e Taliesin vê-se ao longe.
Não escondo que as lágrimas me vieram aos olhos.
Mas o homem queria mostrar-me coisas…
"Vou agora mostrar-lhe outra quinta que Mr. Wright comprou…" . Lá fomos ver mais um conjunto de edifícios. Aí nem saímos do carro. Um dos edifícios tinha o toque do Mestre. Os outros eram tradicionais edifícios da região.
"Agora vou mostrar-lhe a escola onde eles trabalhavam…" voltamos para trás, passamos novamente pelo pequeno cemitério e metemos a um desvio; por todos os lados letreiros diziam "No hunting, no trespassing". "No visitors, closed until May", mas nós avançamos. O carro parou e eu como um louco avancei para o edifício, cuja localização aliás tinha pressentido da estrada; que dizer? Só posso dizer que fiquei maravilhado "Ali é o estúdio, ali atrás têm um teatro, vá e veja…". Fui e espreitei pelos vidros; Lá estava a conhecida sala de trabalho, tendo na entrada uma grande fotografia de Wright e um poema de Walt Whitman.
Espreitei o teatro; um biombo japonês, o balcão de Wright, o palco… tudo parado… nem vivalma… mas os espaços falavam com um impacto extraordinário. Contornei o teatro e encontrei um terraço debruçado sobre a pequena colina. Na escada que dá acesso à entrada do estúdio uma pequena escultura de Wright bate exactamente com o edifício. Não cuidei de ver pormenores mas pressenti em tudo uma riqueza de formas, dum à vontade que nunca encontrara na arquitectura contemporânea.
Senti-me na Idade-Média, na Grécia ou no México, na presença de uma Catedral, de um Panteon ou de um templo azteca, tal é a integridade daquela arquitectura. Vi o mais que pude. Mas o homem já estava dentro do carro com o motor a trabalhar…
Voltamos à estrada. “Quer ver outra casa, dum arquitecto que trabalhava com Mr. Wright e comprou aqui uma quinta?" Com certeza. Lá fomos. Um rico jogo de edifícios na paisagem, a nota de Wright por toda a parte.
"Aqui vamos ver aquela quinta perto da casa". Novamente no carro subimos a pequena encosta até à quinta. Num ou noutro pormenor, Wright lá estava. Quando descemos da quinta o homem apontou para outra encosta e disse: “Ali é a casa da irmã, também foi projectada por ele… mas está muito abandonada…”. Não insisti para irmos lá, tão amável era o homem. Mas vi nesse momento, mais uma vez e melhor do que nunca, o velho moinho, o Romeu e Julieta que Wright desenhara nos princípios da sua carreira…
Descemos. Sempre a paisagem magnífica, grande mas não desproporcionada, uma corde amarelo queimado em tudo…
"E agora a casa…". Passamos pela entrada principal mas ele achou melhor irmos pela entrada de serviço. Começamos a subir e por entre a vegetação comecei a descortinar planos vários de paredes e de coberturas lá em cima. Os avisos sucediam-se: "no visitors… no trespassing… no hunting… closed until May…"
Entramos num páteo de serviço, onde estavam vários automóveis. Saí, vi e fiz umas fotografias, mas não tive coragem de avançar.
Senti que já tinha compreendido Taliesin e estava emocionalmente extenuado.
Sentei-me no carro e disse ao homem: "é melhor não abusar". Cá em baixo a água corria, no topo de um muro por grandes tubos de grés colocados em fiada…
Eu estava realmente extenuado.
Vimos mais uma "farm" de Mr. Wright, despedi-me de tudo aquilo e voltamos para a aldeia.
O homem tinha tomado conta de mim à meia-hora e deixou-me exactamente duas horas depois.
Quando me deixou eu estava longe de mim e longe de tudo.
Resolvi sair da aldeia e avançar pelo campo. Tomei uma estrada poeirenta onde passava de vez em quando um carro.
Então chorei como uma criança… Taliesin não me saia (nem me sairá) dos olhos; até a cor do pó da estrada me lembrava Taliesin. Avancei pela estrada não sei até onde. Não podia pensar concretamente. Qualquer coisa se apoderara de mim. Sentei-me algures. Descansei.
Lágrimas várias: Notre Dame, Chartres, Cordova, Capela de Miguel Ângelo, – "olhos que nunca se molham mas vêem quando olham…" (Afº. Lopes Vieira).
Tinha razão o poeta: "olhos que nunca se molham não vêem quando olham". Naquelas duas horas eu tinha sofrido, estou certo, um dos maiores choques, talvez o maior da minha vida de arquitecto.
Taliesin, disse já, é mais do que um edifício, uma paisagem; mas acrescento agora, Taliesin é também uma vida e uma filosofia. Eu compreendi Wright e o seu chapéu, compreendi as suas formas e o seu amor à terra, o seu pensamento e o sentido das suas coisas… . E ao sentir toda aquela vida de criação, tomei também contacto com outra realidade: a da morte do Homem no lugar do seu sonho.
Porque exactamente Taliesin impressionou-me pelo que possui de total, de cósmico, pelo que existe ali para além da pedra, da madeira, deste ou daquele requinte da forma.

Tudo se esquece ali de acidental da vida de Wright: os seus caprichos formalistas, a sua vaidade, o custo das suas obras, os seus automóveis, as suas pequenas coisas do dia a dia; tudo esquece a quem vir Taliesin como eu tive a oportunidade de ver e Taliesin aparece então com a força de uma rocha, a beleza de uma flor ou a calma de um lago.
Taliesin, além de me fazer chorar durante as primeiras reacções, obrigou-me a pensar muito.
Um dia ouvi o Sr. Giedion dizer com um sorriso, a propósito da "famigerada" integração das artes, que "Mr. Wright afirma não existir para ele tal problema porque ele é pintor, escultor e arquitecto".
Estou convencido que a integração das artes pela qual a entendem os funcionalistas é coisa estúpida (O Harvard Graduete´s Center é mais uma prova evidente) e estou convencidíssimo de que Wright resolveu o problema como foi resolvido aliás nos velhos tempos, onde começa a arquitectura e acaba a escultura ou a pintura nos edifícos de Wright? E onde acaba a arquitectura e começa o paisagismo ou o urbanismo? Ninguém sabe.
Este homem consegue nos seus edifícios integrar as artes como o fizeram os góticos, por exemplo, e veio provar-me de que é possível (embora com génio) resolver o tal dilema a que já me referi neste diário: dum lado, o funcionalismo mais ou menos prosaico nas arquitecturas, e do outro os museus cheios de pinturas e de esculturas mais ou menos modernas.
E Taliesin é também uma lição no que respeita à prisão dum edifício aos valores naturais e humanos. Ali uma família e um Homem presos a uma terra, um conjunto de edifícios nascendo duma paisagem, a tudo presidindo um pensamento e uma forma. Ali uma força enorme liga coisas e seres. E pensar eu que vi um templo indiano e uma casa de chá japonesa no Museu de Philadelphia e claustros românticos em Nova York!
O poder de integração em Taliesin é tão forte que chega a ofender-se Deus pensando que Wright também foi o criador daquela paisagem!
Vi muita coisa na América até hoje: desde as melhores Racket Girls do mundo, até à altura do Empire State, vi estatísticas e números e cadeias de montagem, vi edifícios e arquitecturas, vi museus e planos e planos, vi highways e prosperidade por todo o lado: mas a poesia, a humanidade e a grandeza, só as encontrei em Wright. Tudo o que vi compreendi pela inteligência; aqui o pouco que vi permitiu-me sentir tudo sem nada me ter sido explicado.
Os edifícios de Taliesin não são crianças em idade; alguns terão os trinta ou quarenta anos, o que aliás o seu estado de conservação deixa advinhar, no entanto, mesmo que estivessem em ruínas, conteriam ainda um grande poder de expressão, como vi monumentos do passado; o que seria uma ruína da Vila Savoie ou uma ruína do Seagram Building? O tempo em Taliesin joga a forma da arquitectura e da paisagem, o que creio não acontece em 90% da arquitectura moderna.
Vi há tempos a casa de Gropius em Lincoln: quando vi Taliesin, a casa de Gropius pareceu-me um frigorífico pousado numa colina!
Não há dúvida que o Zevi tem razão: o Sr. Giedion enganou-se, ao pôr Wright no princípio e Le Corbusier no fim do seu livro; foi um pequeno engano… de pôr tudo ao contrário. E o mundo sente, todos nós sentimos (e eu chorei por isso mesmo) que me falta qualquer coisa, que a máquina está perturbada, que o caminho não é exactamente este e que os anos passam…
Estamos a fazer uma arquitectura de “esqueletos decorados”; e Wright conseguiu criar organismos. Quem se atreve a discutir a forma de um dedo, a cor de uma flor ou o bico de um pelicano? São assim… porque são assim.
É isso que nós precisamos de fazer em lugar de andar a vestir esqueletos com pinturas e esculturas ou a apresentar os esqueletos em pêlo como se um animal fosse apenas o seu esqueleto ou a qualidade dum vinho pudesse apreciar-se pela fórmula química que o representa…

Está tudo doido.
Enfim isto é um pouco, muito pouco, do muito que meditei sobre Taliesin.
Lá repousei pelos campos desse Wisconsui que ele tanto amara e pelas cinco horas voltei a Spring Green. Comi alguma coisa (o mesmo hamburguer, idêntico copo de cerveja) e vim para a estrada esperar o bus.
Estava já mais calmo mas longe ainda de estar calmo. E tão aéreo ainda que o bus passou e só quando passou é que lhe fiz sinal para parar. O homem ficou zangado e parou muito longe porque vinha largadíssimo.
Enfim cheguei a Madison perto das 8 da noite.
O dia tinha sido extraordinariamente forte. Quando me deitei ainda as pernas me tremiam e ainda os olhos estavam molhados.

(Soube hoje, 11 de Abril, que no dia 9 em que visitei Taliesin fazia exactamente um ano que Wright morrera; talvez por isso mesmo a sua presença era tão forte neste dia…).

 

Diário da Viagem aos USA, 1960

Fernando Távora
Abril, 9, Sábado

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